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20 de set. de 2009

A que preço estamos negociando o futuro da infância?

Publicado em 15/09/2009
Por Maria Helena Masquetti
no site: http://www.alana.org.br/

Aconteceu mais uma vez. O Kids & Tweens Power Brasil 2009, a maior conferência já realizada no país sobre o poder de consumo de crianças e adolescentes, foi realizado entre 25 e 27 de agosto. Sem autorização explícita da sociedade, os mais gabaritados profissionais de comunicação se reuniram novamente para dissecar o modo de ser, os gostos, os anseios, os temores e os questionamentos de nossas crianças e adolescentes. O objetivo, como de hábito, é utilizarem-se, em seguida, dessas informações a fim de desenvolverem ações para fidelizar o público alvo a produtos e marcas, não só a curto como a longo prazo. Um jogo desigual, no qual o negócio é bom apenas para uma das partes face à incapacidade das crianças de julgar o caráter persuasivo das mensagens comerciais. Embora resistentes à ideia de não mais anunciarem para as crianças, a novidade no evento foi a discussão preocupada (finalmente) com os aspectos legais da publicidade para crianças, em função da forte pressão social por regulamentações.
É visível o abismo entre o evento e o que diz o primeiro promotor de Justiça de Defesa do Consumidor do Ministério Público de São Paulo, João Lopes, em entrevista ao documentário de Estela Renner Criança, a alma do negócio: "Se a criança, pela lei, não pode comprar nada por ser considerada incapaz pela legislação, como se admitir uma mensagem publicitária dirigida a ela, e muito menos uma peça publicitária que seja persuasiva?”.
Além dos projetos de lei pela proibição da publicidade dirigida à infância em tramitação no Congresso, as regras e legislações sobre as quais discutiram são as que tratam dos direitos das crianças, seja a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a convenção da ONU ou o próprio Código de Defesa do Consumidor. Cada um desses diplomas legais, a seu modo, assegura que a criança deve ser colocada a salvo de toda forma de negligência; que o direito ao respeito consiste na inviolabilidade de sua integridade física, psíquica e moral; que ela deve ser protegida contra a exploração econômica; que é proibida toda publicidade que se aproveite de sua deficiência de julgamento e experiência. No entanto, a existência de um evento de marketing para crianças, por si só, significa que estas leis permanecem carentes de observância e de um único e claro comando legal que as englobe.
Acreditar no que ouve e vê é natural da criança e “viajar” na fantasia é essencial para o desenvolvimento de sua criatividade e para a construção de sua identidade. Infelizmente, é desta matéria prima que o marketing infantil se alimenta. Em lugar de honrar a infância, a sedução comercial invalida nas crianças seus verdadeiros valores e as obriga a renunciar a genuinidade diante da ameaça de exclusão de seus grupos: “Todo mundo está usando”, “E você, o que está esperando?”
Entre os temas discutidos no evento estiveram: “O encurtamento da infância e suas implicações no consumo”; “Como fidelizar e conquistar novos clientes utilizando o marketing de relacionamento dentro das escolas de educação básica” e “O público infantil como um dos segmentos mais promissores, especialmente para o mercado de cosméticos”. Pela naturalidade com que costumam argumentar que estão apenas indo ao encontro daquilo que o público deseja, parecem não admitir que a maioria dos desejos de consumo hoje manifestados por crianças e adolescentes têm sido implantados neles pela própria ação contínua da comunicação mercadológica.
A infância não estaria sendo encurtada se as crianças não fossem chamadas para fora dela tão insistentemente pelo assédio consumista, contribuindo, entre outros problemas, para o aumento dos índices de gravidez na adolescência. Segundo a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher de 2006, até os 15 anos, 33% das entrevistadas já haviam tido relações sexuais. Os índices da Sociedade Brasileira de Pediatria, que apontam 30% das crianças com sobrepeso e 15% delas já obesas, poderiam diminuir sem tantas mensagens de alimentos não saudáveis e embalagens sedutoras. A violência não estaria sendo estimulada se as mensagens persuasivas não atingissem igualmente os que, muitas vezes, não têm acesso sequer aos itens básicos. Em 2006, os meninos reclusos à Fundação Casa (antiga Febem) revelaram às pesquisas da instituição que 55% de seus delitos foram de roubos, evidenciando a crença de que serão aceitos na sociedade pela quantidade de objetos caros que puderem ostentar.
Hoje, em 28 países, a publicidade dirigida às crianças ou é proibida ou rigorosamente controlada. E a lista publicada em 2005 pela revista The Economist conclui que os 10 países com melhor qualidade de vida têm restrições à publicidade para crianças. Em lugar de discutir formas de atraí-las para o consumo, o Kids & Tweens Power daria sua contribuição efetiva à sociedade se discutisse, por exemplo, por quê o consumismo na infância ainda é estimulado no Brasil. Cada vez mais as empresas buscam atrelar seus nomes e produtos à preocupação com a sustentabilidade do planeta. Que este discurso seja, então, efetivo e baseado na reflexão coletiva sobre o preço que pagaremos se levarmos ao futuro crianças fazedoras de montanhas de lixo e cujo sentido de felicidade seja o ter em lugar do ser.

*Maria Helena Masquetti, 57, é psicóloga, possui especialização em Psicoterapia Breve e de Emergência e integra a equipe do Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana. Também foi publicitária por 12 anos.



Por favor, pais e educadores, cuidado com a Cultura Midiática!

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